el doctor casita, os maluquinhos das doenças e as mães desesperadas
Nos últimos tempos tenho vindo a apreciar com crescente agrado a série Dr. House. Talvez seja o humor sardónico e arrogância da personagem representada pelo actor Hugh Laurie, talvez seja o rigor científico do argumento (ainda assim, não me conseguem convencer que alguém seja capaz de fazer um diagnóstico baseado unicamente no movimento de um iô-iô ou nas previsões de uma magic eight-ball), ou talvez, quiçá, pura e simples peer pressure (e sempre há as recordações do grandioso Black Adder). O facto é que a série cumpre os objectivos a que se propõe: entreter e auxiliar os estudantes dos cursos na área da Saúde a passar nos exames.
Mas isto não explica o culto que se gerou à volta desta série, pois é bem sabido que os estudantes de Medicina e afins não nascem que nem cogumelos (digamos que são menos do que as mães que desejam ter filhos médicos, muito menos…).
Analisemos os contras da série: apenas 6 actores residentes e nenhum deles é bem parecido (ok, há pelos menos 4 bem parecidos, dependendo dos gostos, mas é bem sabido que a inteligência tira a tusa toda), intermináveis conversas maçadoras sobre coisas de médicos (com uma série de termos técnicos que niguém sabe o que significam), não há uma única enfermeira boazona, o personagem principal é mal-educado, bruto, insensível, autoritário, azedo…Ou será que não?
É bem conhecida a apetência dos portugueses, em particular dos mais idosos, pelas visitas ao médico. É ver aquelas alminhas a gravitar à volta do Sr. Doutor. E mesmo os que não gostam de lá ir, assim que lá chegam desatam a desfiar um rol de maleitas, comichões, irritações, alergias, manchinhas e dorzinhas várias. É um fascínio mórbido por tudo o que é patológico. É o mesmo voyeurismo das pessoas que param no meio da estrada para ver um acidente, mas neste caso virado para eles próprios. No fundo, toda a gente quer ver sangue, tripas e morte, para depois sentir aquele arrepiozinho na espinha e ir contar tudo aos amigos e conhecidos…e menos conhecidos. Ah, a piedade é um sentimento glorioso!
Até aqui estamos todos de acordo. Agora, porque é que as pessoas insistem nesta fixação absurda pelas idas ao médico quando sabem perfeitamente que há uma boa probabilidade de serem atendidas por um pedante cara-de-cú de um Sr. Doutor? Simples. Porque nas conversas de café não há nada mais impressionante que dizer “Fui ao hospital para me removerem um quisto sebáceo. Como se já não bastasse a sangueira toda, o médico ainda tinha que ser uma besta quadrada!”. É-se elevado aos píncaros da coitadice, passaste a ser alguém digno de toda a comiseração não só porque sangraste, mas também porque foste mal-tratado. É algo profundamente arreigado na nossa portugalidade: se não se é “o maior” por feitos alcançados, sempre se pode ser “o maior coitadinho de que há memória”.
Agora elevem o médico arrogante português médio à 9ª potência, juntem-lhe uma taxa de erro nos diagnósticos de 0 e temos a receita para uma série de sucesso: o médico que para além de curar também trata os pacientes abaixo de cão (o sonho húmido de qualquer hipocondríaco que se preze!)…Ou se calhar são só as futuras mães que veêm a série na esperança que o conhecimento seja transmitido por via transplacentária.
Mas isto não explica o culto que se gerou à volta desta série, pois é bem sabido que os estudantes de Medicina e afins não nascem que nem cogumelos (digamos que são menos do que as mães que desejam ter filhos médicos, muito menos…).
Analisemos os contras da série: apenas 6 actores residentes e nenhum deles é bem parecido (ok, há pelos menos 4 bem parecidos, dependendo dos gostos, mas é bem sabido que a inteligência tira a tusa toda), intermináveis conversas maçadoras sobre coisas de médicos (com uma série de termos técnicos que niguém sabe o que significam), não há uma única enfermeira boazona, o personagem principal é mal-educado, bruto, insensível, autoritário, azedo…Ou será que não?
É bem conhecida a apetência dos portugueses, em particular dos mais idosos, pelas visitas ao médico. É ver aquelas alminhas a gravitar à volta do Sr. Doutor. E mesmo os que não gostam de lá ir, assim que lá chegam desatam a desfiar um rol de maleitas, comichões, irritações, alergias, manchinhas e dorzinhas várias. É um fascínio mórbido por tudo o que é patológico. É o mesmo voyeurismo das pessoas que param no meio da estrada para ver um acidente, mas neste caso virado para eles próprios. No fundo, toda a gente quer ver sangue, tripas e morte, para depois sentir aquele arrepiozinho na espinha e ir contar tudo aos amigos e conhecidos…e menos conhecidos. Ah, a piedade é um sentimento glorioso!
Até aqui estamos todos de acordo. Agora, porque é que as pessoas insistem nesta fixação absurda pelas idas ao médico quando sabem perfeitamente que há uma boa probabilidade de serem atendidas por um pedante cara-de-cú de um Sr. Doutor? Simples. Porque nas conversas de café não há nada mais impressionante que dizer “Fui ao hospital para me removerem um quisto sebáceo. Como se já não bastasse a sangueira toda, o médico ainda tinha que ser uma besta quadrada!”. É-se elevado aos píncaros da coitadice, passaste a ser alguém digno de toda a comiseração não só porque sangraste, mas também porque foste mal-tratado. É algo profundamente arreigado na nossa portugalidade: se não se é “o maior” por feitos alcançados, sempre se pode ser “o maior coitadinho de que há memória”.
Agora elevem o médico arrogante português médio à 9ª potência, juntem-lhe uma taxa de erro nos diagnósticos de 0 e temos a receita para uma série de sucesso: o médico que para além de curar também trata os pacientes abaixo de cão (o sonho húmido de qualquer hipocondríaco que se preze!)…Ou se calhar são só as futuras mães que veêm a série na esperança que o conhecimento seja transmitido por via transplacentária.